CAVERNA
Porque escrever é ato de libertação
Textos
Epitáfio
 
Ju. Eu estou aqui porque tenho pensado demais em nossa relação. Nos sentimentos que tenho mantido por você e de tudo que estou passando sozinho, sem realmente você estar aqui, do meu lado. É tão frio. Eu não tenho suportado.
 
Sei que é difícil para você. Imagine o quanto é difícil para mim. O quanto eu gostaria de ser diferente. Diferente para mim e para você. Eu tento dizer para mim. Tenha paciência, um dia vamos nos encontrar. Mas sabe, Ju. Acho que não dá.
 
Eu não aguento mais tanta solidão. Eu não aguento aguentar essa dor que aquece minha mente, meu peito. Essa dor que machuca meu coração. Está difícil dizer para você assim. Eu estou aqui. Você... Você poderia me dizer algo.  Você me olha e não diz nada! Dizer suas famosas frases. Como eu queria ouvir de novo! Como eu adorava tanto suas frases: Valdir, eu odeio sua autocondenação. Sua esquizofrenia, sua autocompaixão.  Escolha, meu filho. Ou você é herói ou vilão. De onde será que você criava essas sentenças? Eu um professor extasiado com sua magia.
 
Um dia me levou para a praça, me fez sentar debaixo de um ipê, florido de branco. O outono fazia cair algumas pétalas sobre nós. Eu achava enfadonhas suas manias, seus passeios no meio do dia. O que você vê? Eu não vejo nada, Ju. Pelo amor de Deus eu preciso voltar ao trabalho. Deixe de ser rabugento, nego. Fica e veja. Pegava em minhas mãos (e eu adorava seu toque macio e quente sobre meus dedos dizendo eu estou aqui). Eu ficava. Olhava principalmente os carros que passavam e me olhavam perdendo o tempo, deixando o dinheiro escorrer, e a vida perder o sentido. Mas você era menina. Eu não conseguia ser menino. Queria tanto estar no mesmo tempo de vida que criara. Eu não consegui. Você lutava para me mostrar que na vida vale a pena olhar o que ninguém vê. Eu nunca vi a magia que tanto quis me provar.
 
Eu trouxe essa flor. Bem. Acho que você deve estar cansada de tantas flores. E a mesma. Na verdade, acho que eu estou cansado de trazer essas flores. Vejo que nenhuma delas você notou. Somente chorou. E chorou sem notar a minha dor. E cansado de vir aqui. Sinto muito. Sinto dizer dessa forma, mas acho que no lugar onde está, eu não conseguiria esconder qualquer sentimento.
 
 Dizem que aí a gente consegue alguns poderes sobre-humanos, quando realmente aprendemos amar. Que conseguimos ativar capacidades adormecidas, esquecidas por causa da pressa, por causa das pessoas e do meu mau humor. Eu sempre tive sonhos em que eu estaria voando. Nunca consegui. Será que um dia eu poderei voar, aqui? Acho que esse sentimento seria a melhor sensação que eu poderia ter.
 
Uma vez, você pegou em minhas mãos. Eu não sei como soube que eu estava com medo. Eu realmente estava aterrorizado. Cidade nova. A gente precisava começar tudo de novo. Fugir daquelas pessoas que engessavam nossos planos. Você me olhou doce dizendo que tudo ficaria bem. Daria certo. Que estaríamos felizes haja o que houvesse. Mas acho que levei conosco o medo e o receio de ser feliz. Você me fez atravessar a rua. Mas atravessar eu nunca quis.
 
Eu sinto tanta dor, Ju. Dizer isso para você. Mas eu acho que nessa altura, minhas agruras, você já sabia há muito tempo. Estava esperando a minha coragem de dizer, de desamarrar, desapegar, me soltar. Tentar ser verdadeiro comigo mesmo.
 
Não, Ju. Eu não me apaixonei. Não é outra mulher. Eu não sei. Sinceramente eu tentei procurar outro consolo. TraÍ meus próprios princípios procurando apenas prazer. Mas não terei, nunca mais mulher como você. Dói saber que se foi e eu fiquei. Dói saber que superou e sou ainda aquilo que não sei ser quem sou. Ainda em meio a fumaça, minhas confusões, meus tormentos sem definições. Eu ainda não sei onde estou, depois de 5 anos.
 
Talvez esteja me olhando aquele olhar de mel, dizendo: Querido, no Céu, há resposta para tudo. Mas não adianta ficar mudo enquanto viaja na dimensão. Grita! Deixe de ser covarde, mostre o sentimento e que nunca mais guarde os principais momentos num caixão escuro. Eu sempre procuro o lado bom. Você se foi e precisa ir. Siga a luz e deixa fluir. Um dia Deus permitirá nosso encontro. Não se preocupe com o tempo. Eu ficarei bem. Seja valente. Eu estarei rezando por ti também.
 
“Olho profundamente o tempo com luzes vermelhas montando na dimensão. A minha dor diminui um pouco e consigo ouvir meu coração. Levanto-me vagarosamente por causa da lama que me segura e prende minhas pernas e consigo dar meus primeiros passos àquela direção.”
 
Valdir dos Santos Lopes
26 de agosto de 2016
valdirfilosofia
Enviado por valdirfilosofia em 26/08/2016
Alterado em 22/09/2016
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